Na madrugada de 08 de março corrente concluí a leitura de uma
das obras mais encantadoras da literatura brasileira. Trata-se do livro “GRANDE
SERTÃO: VEREDAS”, do renomado escritor mineiro João GUIMARÃES ROSA.
A obra que acabei de ler foi publicada
pela editora “Companhia das Letras”, em sua 22ª Edição, 8º impressão e tem 600
páginas. Iniciei a leitura na noite de 12 de setembro de 2023 e conclui na madrugada de 07
de março de 2024.
Trata-se de um romance regionalista, que
foi publicado pela primeira vez no ano de 1956 e narra a história de amor entre
dois jagunços” Riobaldo e Diadorim. O enredo se passa nos Estados de Minas Gerais,
Bahia e Goiás e o centro da obra é o sertão brasileiro, que é considerado como
o mundo. "O sertão está dentro da gente”.
Quando iniciei a leitura, confesso
que por três vezes dei uma pausa, mais ou menos entre as páginas 40 e 50, pois achei complicada
e o linguajar de difícil entendimento, pois é recheada de
neologismos, arcaísmos e brasileirismos. Na verdade, a obra é um monólogo –
onde um personagem, ex-jagunço, narra a sua história a um “turista”, personagem
“invisível” no livro, pois não tem nome, nem interfere na conversa, apenas
escuta.
Não foi em vão que o escritor Osvaldo J. de Morais, em sua
obra “Grande Sertão: Veredas o romance transformado”, publicado pela Editora da
Universidade de São Paulo, ano 2000, falando sobre a obra de Guimarães
Rosa, comentou: “Passamos por diversas
fases: turbulência, aturdimento, embriaguez e deslumbramento”. Página 23. Nada
mais conclusivo que essa assertiva, pois é exatamente o que o leitor sente ao
fazer a leitura da obra em comento.
Curioso com essa novidade -dificuldade inicial na compreensão da leitura, fui pesquisar
na internet, informações sobre a obra e vi que de fato, quase todas as pessoas,
quando iniciaram a leitura se depararam com essa dificuldade de compreensão,
mas que ao prosseguir a foram “mergulhando no enredo” e a dificuldade
de compreensão se transformou em pausar a leitura, pois a compreensão se abriu a o leitor passou a ser um figurante no enredo.
Como auxílio de excelência, em minhas
pesquisas encontrei o audiolivro dramatizado, com produção, edição e narração de
Izabela Loures, que foi de uma importância magnífica, porque fiz toda a leitura
acompanhado do áudio – que na prática equivale a ler a obra duas vezes. Nesse audiolivro a narração acontece com o auxílio de sons do sertão, como ventos, chuvas, tiros, cachorros latindo, mogido de bois, etc.
O livro é repleto de frases importantes,
que destaquei com lápis marca texto para publicar nesta matéria, com a intenção
de incentivar o leitor a desejar adquirir e ler a obra.
Um diferencial nessa obra é que ela não
é dividida em capítulos, como a maioria dos livros. Talvez por isso é considerado como um dos livros mais difíceis
da língua portuguesa, embora essa dificuldade seja apenas no início, porque
quando continuamos a leitura e mergulhamos em seu conteúdo, mudamos de
estranhos para mais um personagem, pois passamos a ser companheiros dos caminhos,
desafios e aventuras dos jagunços.
Uma marca registrada nessa obra é a
metafísica. O bem e o mau, Deus e o diabo, pactos, vinganças, vida e morte,
amor e paixão permeiam cada página, de forma tão contagiante que quando concluímos
sua leitura temos o desejo de voltar ao início.
O destaque maior da obra é a amizade,
transformada em amor impossível, vivido entre os jagunços Riobaldo (personagem interpretado
na serie da TV por Tony Ramos) e Diadorim (papel vivido pela atriz Bruna Lombardi). Na
conclusão da obra acontece uma cena deslumbrante, que não vou descrever para
que o leitor tenha interesse em adquirir a obra.
Outra reflexão muito forte que nos
remete a leitura é a "travessia", que na obra é representada, inicialmente por
uma cena em que o personagem Riobaldo, quando criança, tem que atravessar de
barco um trecho do rio São Francisco, para outra margem na companhia de outro
garoto, que lhe diz: “Carece de coragem. Carece de ter muita coragem”.
No ano de 1952, o autor GUIMARÃES
ROSA, para escrever essa obra, percorreu 240 quilômetros na região central de
Minas Gerais na companhia de oito vaqueiros e 300 cabeças de gado, levando
consigo, pendurada no pescoço, uma caderneta, anotando tudo que via e ouvia naquela
aventura – as conversas com os vaqueiros, a beleza das paisagens, as sensações e até as dificuldades vivenciadas durante aquela “travessia”, que deixaria
marcas impregnadas em toda sua vida.
Outras
travessias estão presentes, porque os personagens sempre estão atravessando situações,
territórios e batalhas a todo instante. Os questionamentos da vida também merecem destaque na obra, pelo que destaco duas frases nesse sentido: “Viver é
um negócio muito perigoso” e “Medo tenho não é de ver a morte, mas de ver nascimento”.
É de bom alvitre também lembrar que
Guimarães Rosa falava: Francês, Holandêz, Inglês, Alemão, Romeno, Italiano,
Húngaro, Russo e Chinês. Era formado em medicina e em 1938 foi cônsul adjunto, na
cidade de Hamburgo, na Alemanha e entre 1946 a 1951, residiu em Paris, onde
consolidou sua carreira diplomática.
De fato, é um livro que deve ser lido, comentado e relido durante a nossa vida. Vale a pena.
Abaixo destaco vinte frases da obra (tive
dificuldade para essa seleção, pois na leitura marquei centenas), que julgo importantes
para nossa reflexão, lembrando que no youtube existem centenas de vídeos, dicas
de leitura e documentários falando sobre a obra aqui comentada e seu autor.
FRASES DE DESTAQUE:
“O real não está na saída
nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia”
“O mundo é mágico. As pessoas não
morrem. Ficam encantadas”.
“A morte de cada um já está no
edital”
“Quem elegeu a busca não pode recusar
a travessia”
“O senhor
tolere, isso é o sertão”.
“Pão ou
pães, é questão de opiniães”
“O sertão
está em toda parte”
“Viver é
um negócio muito perigoso”
“Ah, a
gente na velhice, carece de ter sua aragem de descanso”.
“O diabo
na rua, no meio do redemunho...”.
“Tem
gente, nesse aborrecido mundo, que matam só para ver alguém fazer careta...”
“O bem e
o mau andam misturados”
“O senhor
sabe: sertão é onde manda quem é forte, com
as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado!”
“O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas
não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – Mas que elas sempre vão
mudando”.
“Sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do
que o poder do lugar. Viver e muito perigoso...”
“Jagunço não é muito de conversa continuada nem de amizades
estreitas”.
“Perto de muita água tudo é feliz”.
“No sertão, até enterro simples e festa”.
“Medo tenho não é de ver a morte, mas de ver nascimento”.
“Todo é e
não é...”
Imagens extraídas da internet